Fonte: Valor Econômico
Meia dúzia de jatos recém-pintados ocupam um hangar gigante. Um deles, adornado com o logotipo da JetBlue, está sendo equipado com cem poltronas de couro e monitores individuais de TV, além de 45 quilômetros de fios elétricos. Alinhados ao longo do corredor há aviões para a Delta Connection, a panamenha Copa Airlines, United Express e Republic Airways. Pareceria ser uma linha de montagem da Boeing ou Airbus. O hangar, na verdade, está no Brasil, em São José dos Campos, cidade da Embraer, terceira maior fabricante mundial de aeronaves.
Desde 1969, a única empresa a ter conseguido entrar com sucesso no mercado de jatos comerciais foi a Embraer. Mais de uma mil de suas aeronaves voam pelo mundo, incluindo a nova geração modelos com 118 assentos que começa a roer o mercado da Airbus e Boeing, de grandes aviões. No ano passado, a Embraer apresentou lucro de US$ 446 milhões, com receita de US$ 3,83 bilhões, da qual 93% foi obtida no exterior.
Como o Brasil conseguiu sair-se bem em um negócio que exige tecnologia tão alta e tanto capital? Surpreendentemente, os salários, cerca de 30% dos pagos pela Boeing, não são um fator crucial. Em primeiro lugar, a Embraer recorreu à longa tradição de engenharia aérea cuja ponta-de-lança foi o programa aeroespacial da Força Aérea Brasileira, criado após a Segunda Guerra Mundial. Nos últimos seis anos, a Embraer destinou 6% de sua receita para o setor de pesquisa e desenvolvimento. Treina seus engenheiros recém-contratados não apenas em aeronáutica, mas também em finanças e pesquisa de mercado. Os clientes dizem que os aviões da Embraer são bem projetados, confiáveis e mais baratos de operar do que os fabricados pelas rivais.
Em segundo lugar, os brasileiros que conseguem empregos na Embraer sabem que estão entre poucos afortunados, em um país com número limitado de trabalhos de alta tecnologia. Os clientes sentem esse orgulho dos funcionários, diz o diretor operacional da JetBlue Airways, Dave Barger. "É uma cultura muito legal. Encaixa-se muito bem com a JetBlue."
A cada avião que a JetBlue recebe da Embraer, a companhia doa US$ 10 mil para um programa da empresa brasileira que envia para a universidade estudantes da classe baixa que demonstram maior talento. A JebBlue encomendou 101 aviões, no valor de US$ 3 bilhões.
E, por fim, a Embraer é hábil em manter-se no mercado. A empresa, uma ex-estatal, cresce solidamente desde sua privatização em 1994. Suas aeronaves regionais, de 50 lugares, das quais há mais de 850 unidades ainda em operação, colocaram a Embraer no mapa. A atual onda de sucesso origina-se da decisão, no final da década de 90, de investir US$ 1 bilhão para projetar um novo modelo, maior, com capacidade para entre 70 e 118 passageiros, voltado às empresas aéreas de baixo custo e rápido crescimento.
Nesse projeto, os engenheiros da Embraer apresentaram um novo projeto de fuselagem, chamado de "dupla bolha", que resulta em espaço de sobra para os pés, na altura dos ombros e para a bagagem, além de eliminar a poltrona do meio. Mas de 40 empresas aéreas respaldaram o projeto. A inovação colocou a Embraer à frente da canadense Bombardier e preparou o caminho para uma ambiciosa incursão no mercado de jatos executivos.
"Anos atrás, nossos concorrentes diziam: ´Como esses patinhos feios da América do Sul ousam tentar vender aviões no Hemisfério Norte´", conta o vice-presidente de engenharia e desenvolvimento da Embraer, Satoshi Yokota. "Felizmente, nos subestimaram."