Fonte:Forbes Brasil
Houve um tempo em que Superman, o velho super-herói criado por Joe Shuster e Jerry Siegel, em 1938, era considerado por sociólogos e intelectuais de tendência marxista o símbolo máximo do imperialismo americano ao redor do mundo. Não por um acaso, "Superman - o Filme", "Superman II - A Aventura Continua" e "Superman III", todos estrelados por Christopher Reeves, foram lançados a partir do final dos anos 70, durante o auge da Guerra Fria, entre o ultracapitalista Estados Unidos e a ultra-socialista União Soviética.
Com o esfacelamento do sistema sonhado por Marx e Engels, o herói de uniforme azul e capa vermelha - clara menção às cores da bandeira americana - desapareceu do mundo cinematográfico e tornou-se objeto de culto apenas dos fãs mais fervorosos dos quadrinhos. Sua última aparição nas telas foi em 1986 no insosso "Superman IV - Em Busca da Paz", três anos antes da Queda do Muro de Berlim.
Todavia, como indica o título "Superman - O Retorno", o herói está de volta. Desta vez, contudo, nesta era de pós-atentado às Torres Gêmeas, ele não vem "apenas" para salvar o mundo, mas, principalmente, para salvar as bilheterias de dois anos sucessivos de quedas nos negócios que atingiram distribuidores e exibidores de todos os portes nos Estados Unidos e no restante do planeta.
"A idéia da refilmagem surgiu na esteira do sucesso de outros heróis que voltaram às telas", explica Luciana Kikuchi, diretora de marketing no Brasil da divisão de cinema da Warner Bros. , major proprietária da marca "Superman" há mais de seis décadas. "Neste momento a tendência dos estúdios americanos é apostar no que está dando certo", diz a executiva.
Num período em que as bilheterias americanas despencaram 8, 7% somente em 2005, segundo dados da Motion Pictures Association of America, entidade que congrega as maiores majors cinematográficas americanas, os super-heróis tornaram-se sinônimos de salvadores do mercado não só nos Estados Unidos, mas em todo o mundo.
Para se ter uma dimensão de seus superpoderes quando o assunto é venda de ingressos, basta lembrar que em 2004, segundo dados da Filme B, "Homem-Aranha 2", lançado pela Fox, foi visto nos cinemas brasileiros por quase 7, 8 milhões de espectadores e que, em 2005, "Batman Begins", também produzido pela Warner Bros, vendeu mais de 2, 6 milhões de ingressos no Brasil, figurando entre as dez maiores bilheterias de 2005.
"Para a Warner, o ano está apenas começando", afirma Luciana. A diretora explica que a empresa, líder no mercado de distribuição cinematográfica no Brasil, com 17, 7 milhões de ingressos vendidos no ano passado, dedicou o primeiro semestre deste ano a "filmes atípicos", ou seja, de menor apelo junto ao público, como "Syriana" e "Terra Fria", obras que nem de longe tinham vocação para se tornarem blockbusters.
Na penúltima semana de junho, contudo, a empresa lançou no Brasil o remake de "Poseidon", filme-catástrofe sobre um transatlântico que é virado por uma onda numa noite de Ano- Novo. Somente em seu fim de semana de estréia o filme vendeu 235. 300 bilhetes, conforme informações consolidadas pela Filme B.
A estréia de "Superman - o Retorno", em 14 de julho - dia em que se comemora a Queda da Bastilha, marco simbólico do início do capitalismo tal qual o conhecemos hoje - promete ser ainda melhor. "A expectativa é que façamos R$ 8 milhões com 800 mil bilhetes vendidos somente no primeiro fim de semana no País", aposta Luciana.
Tanto otimismo vem apoiado numa intensa campanha de divulgação e numa enxurrada de críticas favoráveis ao filme, como também aconteceu por ocasião do lançamento de "Batman Begins", por parte de veículos especializados da imprensa hollywoodiana, como o "Daily Variety" e "Hollywood Reporter". "O Superman já está no ar", brinca Luciana. Devido ao momento favorável vivido pelo filme junto à mídia, a distribuidora antecipou a estréia do filme nos Estados Unidos para dia 28 de junho.
Com custo de US$ 200 milhões somente para sua produção, "Superman - o Retorno" é disparado o lançamento mais importante da Warner Bros. em 2006. Para divulgar a saga do "homem de aço", o elenco do filme, protagonizado pelo estreante Brandon Routh, como Superman, e pelo tarimbado Kevin Spacey como Lex Luthor, viajará a Paris, Londres, Cidade do México e Tóquio. No Brasil, onde o filme deverá ocupar aproximadamente 450 salas, o "S"estilizado em vermelho com fundo amarelo e dentro de um triângulo invertido ganhará as ruas numa maciça campanha que inclui desde o bombardeio de propagandas na televisão, até painéis eletrônicos em Campos do Jordão, onde boa parte da elite paulista se reúne durante o inverno.
O que se percebe claramente ao conversar com executivos da Warner sobre o novo longa-metragem é a total despreocupação quanto ao conteúdo ideológico do filme. "Superman" não pretende vender mais a noção de supremacia americana, tão abalada com o 11 de Setembro ou a sangrenta e inútil guerra no Iraque. Os superpoderes do herói desta vez estão a serviço de mobilizar o maior número de espectadores possíveis ao redor de sua marca. É de público que o cinema industrial vive e Hollywood melhor do que ninguém e, acima de qualquer ideologia, é bastante consciente disto.
Proprietária da DC Comics, que detém os direitos autorais da marca do herói, toda a estratégia de divulgação do filme por parte da Warner está voltada para que as mais diferentes faixas etárias e sociais se identifiquem com o filme. "A marca Superman é muito importante para nós. Ela está no mercado há quase sete décadas", confirma Ana Stabel, diretora de marketing da Warner Bros. Consumer Products, divisão responsável por licenciamento de produtos com as marcas e personagens da major americana. "No caso de 'Superman' nossa maior preocupação era selecionar produtos que possibilitassem ao consumidor ter uma experiência que o aproximasse dos ideais da personagem e de sua história", revela Ana. Como é de praxe de todas as grandes distribuidoras americanas, a Warner não revela cifras que envolvam seus negócios. O que Ana adianta é que "Superman - o Retorno" tem hoje no Brasil 26 licenciados, que colocarão no mercado desde roupas de ginástica como regatas e leggings até canecas e copos estilizados, num negócio que envolve nomes como Riachuelo, Lojas Americanas e Brinquedos Bandeirantes.
Depois de Batman, Homem-Aranha, Hulk, X-Men e Superman, a próxima a conquistar milhões de dólares será a Mulher Maravilha
E quando o mercado pensar que o fenômeno do homem de aço voou para outras paragens, ele estará de volta em novembro no lançamento do DVD - evidentemente recheado de extras - que deverá ser um dos campeões de venda do setor para o Natal deste ano. "Esperamos vender 300 mil unidades para o varejo e 100 mil para as locadoras", calcula Rodrigo Drysdale, diretor de marketing da Warner Home Video no Brasil.
"Estamos aproveitando o retorno do 'Superman' para capitalizar os outros heróis da Warner", explica o executivo. DVD como os de "Batman Begins" e animações como a "Liga da Justiça" já estão em promoção em grandes redes varejistas como a rede de hipermercados Carrefour, com desconto médio de 50% de seu valor original. "Pretendemos vender 200 mil unidades destes produtos", afirma Drysdale, lembrando que entre as séries de TV lançadas em boxes estão "Smallville" e "Louise & Clarke", ambas também sobre a saga do "Superman".
Para não deixar dúvidas de que o reinado dos super-heróis está de volta dentro da Warner Bros. , Luciana Kikuchi adianta que a Mulher Maravilha será a próxima personagem a voltar às telas do cinema depois do "Superman".
Numa fase em que a Guerra Fria está vencida e os "comunistas" chineses são o povo que mais freqüentou salas de cinema em 2005, com 1, 43 bilhão de ingressos vendidos, conforme informa pesquisa recém-divulgada da poderosa revista francesa "Cahiers du Cinemá", mais importante do que promover ideologias ou ways of life é vender bilhetes e de preferência muita pipoca junto para espantar o fantasma da crise que anda rodando o setor cinematográfico no mundo todo.